A ideia de transpor o universo da chuva
para a linguagem gráfica, em sua forma mais crua, levou o designer e artista
visual curitibano Henrique Martins a mergulhar num trabalho de investigação
desafiador e a criar um livro sensorial. Batizado de “Chove”, a obra é um
estudo de percepção e comunicação visual que conta uma história de chuva,
instrumento balizador de todas as composições gráficas presentes no livro.
O livro será lançado nesta quinta-feira
(8), às 19h, no Museu da Gravura Cidade de Curitiba – Solar do Barão, local
onde ficará em cartaz uma exposição com algumas imagens do trabalho até o dia
1º de novembro, com entrada franca. A publicação é dividida em dois volumes:
“Narrativa” é um livro essencialmente gráfico, e apresenta o resultado do
exercício de transposição da chuva, enquanto o segundo volume, intitulado
“Processos”, serve de memorial para o trabalho, expondo os conceitos, métodos e
processos envolvidos em seu desenvolvimento.
"O interesse vem, por um lado, de
uma obsessão antiga que eu tenho pela chuva. Momentos de chuva revolvem nossas
memórias, nossas histórias, trazem lembranças da infância, do conforto dos
lençóis, das gotas batendo na janela e no telhado. Por outro lado, a minha
vontade era explorar essa atividade lúdica de associar o que se vê e o que se
sente a imagens, fazendo uso de uma linguagem simplificada, para que sua
leitura fosse mais direta, mais clara, e quem sabe incentivar esse exercício de
abstração, de interpretação, de criação de mensagens visuais. E encontrei neste
tema um evento comum a todos, algo corriqueiro, trivial, o que poderia aumentar
o alcance dessas mensagens, e as chances delas serem compreendidas",
explica Henrique Martins.
O livro é o desdobramento de um projeto
desenvolvido como tema de conclusão de um curso de Pós-Graduação em Design
Gráfico, feito por Henrique em 2012. Este trabalho tomou novas formas, foi
reelaborado e executado neste ano, por uma oportunidade trazida com a sua
seleção pelo Edital de Mecenato da Fundação Cultural de Curitiba, e com o
incentivo da Caixa Econômica Federal.
Pesquisa – Para recriar as sensações de
um dia chuvoso no meio gráfico, o autor precisou fazer o que chama de
“transposição” do fenômeno da chuva. Henrique realizou, primeiro, sua leitura,
sua decodificação, buscando um novo olhar sobre esse evento tão comum, o que
incluiu o levantamento de dados técnicos, a análise de como a chuva é
apresentada em filmes, pinturas, músicas, o depoimento espontâneo de amigos
sobre o tema, a observação e vivência da chuva. "Queria fazer uma leitura
da paisagem externa, física, e também da paisagem interna que ela cria, as
sensações que momentos de chuva despertam nas pessoas", relata. Depois,
Henrique organizou e cruzou as informações coletadas para traduzi-las em uma
linguagem visual.
Dessa maneira, os elementos que compõe
a chuva – o vento, a luz, o toque, o som, a memória – serviram de referência
para a construção de sinais gráficos, usando um vocabulário de pontos, linhas,
tons, cores, texturas, opacidade e transparência, cheios e vazios, positivo e
negativo, equilíbrio e caos, para finalmente criar um novo código: uma
“partitura” de chuva.
"Os sinais que definem essa
partitura são combinados, como equivalentes a letras, palavras e frases,
formando paisagens abstratas, sensoriais, de chuva, que são, então, arranjadas
sequencialmente para compor uma narrativa", relata Martins. "Busquei
trabalhar várias gradações e formas de apresentação da chuva, desde uma
paisagem mais serena e silenciosa, até a mais caótica e perturbadora",
completa.
Sinais – Aos poucos, o leitor vai se
familiarizando com os elementos gráficos da obra, e, um a um, identificando os
seus significados. Por exemplo, o ponto representa a chuva quando cai. Quanto
maior, em tamanho e em quantidade, mais intensa é a chuva. Menor, e em menor
quantidade, identifica uma garoa. A proximidade entre esses pontos, desenhados
como a letra x, remete, também, ao chiado característico da chuva. Já as formas
com que são dispostos ao longo das páginas criam diferentes percepções de
ritmo.
A presença do vento pode ser
identificada nas figuras que parecem ser carregadas de um lado ao outro, ou
mesmo nas setas desenhadas no sentido contrário à leitura tradicional de um
livro, como uma resistência ao folhear das páginas. Para ilustrar a variação de
luz e sombra, Henrique optou por usar somente o branco, preto e tons de cinza,
enquanto uma malha de linhas irregulares, elementos quebrados, sobrepostos e
distorcidos, representam os ruídos do trovão.
O projeto gráfico da obra também foi
pensado minuciosamente. Os livros não têm lombada, então os cadernos que os
compõem ficam aparentes em seu dorso. A intenção foi conseguir a abertura
completa de suas páginas, e, com isso, a melhor apresentação das imagens. A
estratégia tornou possível, também, identificar a mudança de luz na obra – a
transição da chuva – até mesmo com o livro fechado.
Sobre o autor – Henrique Martins nasceu
em março de 1980, na cidade de Curitiba. Tem formação em Arquitetura pela
PUC-PR, com especialização em Design Gráfico pelo Centro Universitário Senac de
São Paulo. É idealizador da Lacuna, estúdio criativo que desenvolve projetos
visuais em escalas e mídias diversas, comerciais e autorais, voltados,
principalmente à área cultural, e realizados em parceria com diferentes grupos
e profissionais. Em seu trabalho, busca os possíveis diálogos entre design e artes
visuais, valendo-se de seus métodos e ferramentas para a construção de ideias,
seja por meio de uma imagem, uma marca, um filme, um site, um objeto, um lugar,
ou um livro.
O Museu da Gravura Cidade de Curitiba –
Solar do Barão, está situado na rua Pres. Carlos Cavalcanti, 533, Centro e a
exposição pode ser visitada de terça a sexta-feira, das 9h às 12h e das 13h às
18h; sábados e domingos, das 12h às 18h, com entrada franca.
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