Entre os anos de 1930 a 1945 a música
brasileira viveu um período de apogeu. O desenvolvimento da indústria elétrica
e da indústria fonográfica proporcionaram um impulso à expansão do primeiro
veículo de comunicação de massa, o rádio. O panorama musical destes 15 anos,
que ficaram conhecidos como a Era de Ouro, caracteriza-se, principalmente, pelo
surgimento e reconhecimento de compositores regionais responsáveis pela criação
de uma identidade musical nacional, pela complexidade e sofisticação dos
arranjos, pela ascensão do samba e da marchinha como os estilos mais populares,
além da intensa e ampla interação entre compositores, instrumentistas e
cantores da época. O rádio era o principal veículo de divulgação da música e
impulsionou a carreira de muitos artistas. Os discos de vinil foram se tornando
cada vez mais acessíveis.
Tal fase da música brasileira, marcada
por sucessos atemporais, como “Morena Boca de Ouro”, “Nega do Cabelo Duro”,
“Touradas em Madri”, entre tantas outras canções, que até hoje são referências
da nossa música, inspirou o cantor e ator Marcio Juliano para desenvolver o seu
novo trabalho, resultado de uma pesquisa que já dura cinco anos, pelo menos. O
show “No Samba” estreia dia 7 de novembro, sábado, às 20h, no Teatro José Maria
Santos, em Curitiba. A temporada se estende até dia 22/11, sempre de sexta a
domingo, às 20h.
O show destaca o repertório de
sambistas consagrados, como Ary Barroso, Noel Rosa, Dorival Caymmi, Assis
Valente e Braguinha, mas não reproduz a estética, nem a sonoridade dos
intérpretes da época. Trata-se de uma releitura que promove o diálogo entre o
samba e outros gêneros musicais. O
talentoso músico curitibano Gabriel Schwartz além de tocar flauta, clarinete e
saxofone é quem assina a direção musical. O idealizador, Marcio Juliano (voz e
direção), que também estava à frente do aclamado show Noël, agora divide o
palco com uma turma de virtuoses: Daniel Migliavacca (bandolim, violão tenor e
cavaquinho), Lucas Melo (violão de sete cordas), Luiz Rolim (percussão). A codireção artística e iluminação é de Nadja
Naira, da Companhia Brasileira de Teatro, o cenário de Fernando Marés, o
figurino de Áldice Lopes e a produção audiovisual de João Marcelo Gomes,
grandes e antigos colaboradores da Cia Ilimitada, realizadora do projeto.
“O conteúdo das letras foi o principal
critério de seleção do repertório, não foi fácil diante de tamanha e vasta
produção, mas escolhi ao todo 15 músicas. Embora também sejam interessantes e
muito ricas musicalmente, não me deixei levar só pela melodia, mas sim pela
narrativa. Refletem meu momento de vida pessoal, bem como o momento político,
social e cultural do país”, conta Juliano. “Eu Quero um Samba” (Janet de
Almeida e Haroldo Barbosa), “Alegria” (Assis Valente e Durval Maia) e “Com Que
Roupa?” (Noel Rosa) são algumas das escolhidas. “No Samba”, também inclui outros
estilos musicais que na época faziam sucesso no Brasil, como “Judiaria”, uma
guarânia composta por Lupicínio Rodrigues; “Sarambá”, composição com letra em
francês e a cubana “Quizás, Quizás, Quizás”, somam no roteiro.
“Nosso interesse não é preservar a
estética tradicional do samba, com todo o respeito que o gênero merece,
misturamos, recortamos e colamos sonoridades distintas neste show que acabou
ganhando uma pegada com influências variadas da música moderna, sem
preconceitos”, revela Schwartz. “Trata-se de um show inusitado, cuja linguagem
vem sendo desenvolvida em trabalhos anteriores como Noël (Marcio Juliano) e
Cyrk (Trio Quintina), com preocupação cênica e de roteiro, não é só um show de
música, mas também não é um musical, tecnicamente seria um show cênico musical,
mas ainda não há um termo para definir este estilo de apresentação”,
complementa.
A participação virtual de um trio vocal
feminino composto por Katia Drumond, Fátima Castilho e Roseane Santos e
projeções mapeadas de vídeos em algumas músicas dão uma ideia do que esperar do
trabalho que oferece não só entretenimento, mas abre espaço para protestar
usando o samba como ferramenta e, sendo assim, vale até fusões mais radicais
como samba e rap. “O público vai ver um show multidisciplinar, divertido, com
interpretação bem-humorada e músicas muito bem escolhidas, compondo um
repertório representativo desta rica fase da música popular”, adianta Schwartz.
“O humor e o romantismo que o Marcio
imprime nas escolhas de interpretação das canções, a complexidade e
permeabilidade dos arranjos musicais, o virtuosismo dos músicos convidados, a
política entrelaçada nas letras das canções, a instalação
cenário/vídeo/plateia/palco sinalizam que nada no show é horizontal,
despretensioso ou superficial. Ao contrário, tudo é vertical, poço profundo,
mar revolto”, avisa Nadja.
“No Samba”, que pode ser lido também
como uma negação do gênero, considerando o samba de raiz, brincando como se
fosse “Não” em inglês, ainda assim oferece uma oportunidade de conhecer e
resgatar uma das melhores fases da música popular. Por outro lado, “No Samba”
também aponta para um caminho de retorno a este e outros gêneros musicais
legitimamente brasileiros.
O Teatro José Maria Santos está situado
na rua Treze de Maio, 655, São Francisco e os ingressos custam R$ 20,00 e R$
10,00 (meia). Mais informações: 3324-8208.
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