Conhecimentos tradicionais, segredos
das plantas medicinais, crença e muita vontade de cuidar do próximo. Estes são
alguns dos ingredientes que compõem a saga humana das benzedeiras, realidade de
um Brasil profundo que resiste até o presente. A partir do retrato de um grupo
de mulheres do interior do Paraná que exerce esta prática, o documentário em
curta metragem "Benzedeiras - Ofício Tradicional" revela a saga
humana que se repete em muitos rincões do país. A produção foi viabilizada pela
Fundação Cultural de Curitiba, através da Lei Municipal de Incentivo à Cultura,
com incentivo da Caixa Cultural Curitiba.
Com roteiro e direção da cineasta,
pesquisadora e professora Lia Marchi, especialista em cultura popular, e
produção da Olaria Projetos de Arte e Educação, o filme já pode ser visto na
internet com acesso através de www.youtube.com/olariacultural.com.br.
Na quinta-feira (5), às 19h, acontece o
lançamento na Universidade Federal do Paraná, no Anfiteatro 100, 1º andar do
Edifício Dom Pedro I. O encontro terá a presença da autora da obra e também de
três das benzedeiras retratadas no filme – Agda de Andrade Cavalheiro, Eugenia
Ferreira e Ana Maria dos Santos. Após a exibição, ocorrerá um bate-papo com o
público sobre a produção.
Longe das capitais e dos grandes
centros urbanos, onde por muito tempo médicos e postos de saúde eram raros,
pessoas que se dedicam a ajudar e curar outras com o auxílio de chás, pomadas,
infusões e muita fé, traziam uma alternativa. Em seus 24 minutos de duração,
este documentário mostra o trabalho de um grupo de mulheres dedicadas a esta
missão. Com imagens poéticas e olhar que consegue se aproximar muito ao
universo retratado, o filme revela a luta delas pelo reconhecimento de seu
ofício, dando voz às protagonistas deste processo.
Por meio de depoimentos e cenas do
cotidiano das benzedeiras, o filme mostra detalhes das práticas realizadas por
um grupo de mulheres da região de Rebouças e São João do Triunfo, a cerca de
200 quilômetros de Curitiba. A relação delas com a terra e seus frutos –
raízes, cipós, folhas e demais "remédios do mato" – se dá numa área
de terras comunitárias, cultivadas e cuidadas de maneira cooperativa. A partir
daí, o filme mostra o processo de organização das benzedeiras e, com o apoio do
Movimento Aprendizes da Sabedoria, a conquista do reconhecimento.
Esta trajetória iniciou em 2008, com a
realização do I Encontro Regional de Rezadeiras, curadores e costureiras de
machucaduras de cidades do centro sul do Paraná, organizado pelo Movimento. No
ano seguinte, um mapeamento indicou a existência de 294 detentores de ofícios
tradicionais de cura na região. Em 2010, a Câmara Municipal de Rebouças aprovou
a Lei nº 1401, que reconhece os conhecimentos das benzedeiras como oficio
tradicional de saúde popular. Ficou oficializado, assim, o reconhecimento da
importância do trabalho delas para a saúde pública, garantindo-lhes o direito
de exercerem seus saberes e o livre acesso à coleta de plantas medicinais
nativas. Nas cenas finais, as benzedeiras exibem felizes suas carteirinhas que
garantem a conquista.
SOBRE O FILME
Com uma extensa produção cultural
focada na cultura popular, Lia Marchi conheceu as personagens deste
documentário em 2011, num evento realizado pelo Iphan em Curitiba. Depois deste
dia foram muitas visitas à região de onde elas vieram, muitas conversas e, por
fim, o projeto e a gravação do filme. A obra foi rodada em 2015.
"Nos tempos idos, em que médico
não existia perto, as benzedeiras e os benzedores foram médicos, psicólogos,
enfermeiros, confidentes, amigos. Foram – e são – cura para males que podem
estar numa gama que vai da bicheira à depressão, passando por machucaduras,
inflamações, quebrantes, até o famoso 'ar'", conta Lia. "Foi neste
percurso de singularidades, das vidas privadas destas mulheres, das
particularidades de cada mazela que afligia um doente ou outro que eu vi, em
cada uma delas, o sentido da comunidade, do indivíduo partilhando sua vivência
com a história da coletividade".
Conforme Lia, elas passaram por uma
trajetória de "resignação e luta, misturadas com a alquimia destas
mulheres e homens que souberam lidar com o preconceito, com o medo, com a
desinformação". Foram, sintetiza a pesquisadora e cineasta, protagonistas
de um milagre humano.
O Movimento Aprendizes da Sabedoria
mostrou-se uma ferramenta de grande importância para o futuro das benzedeiras e
benzedores da região, prossegue Lia. "Ao mesmo tempo em que trouxe um
reconhecimento externo aos saberes e fazeres destas pessoas, trouxe também algo
de fundamental para a vida de cada uma delas: o entendimento de seu próprio
valor, a certeza de que sua cultura e sua tradição têm lugar no mundo e o
sentido de que suas práticas vão para além de suas vidas".
SOBRE A DIRETORA E PRODUTORA
Lia Marchi é cineasta, pesquisadora,
professora e produtora. Iniciou carreira artística em 1990, como produtora
cultural e atriz. A partir de 1998 cria e coordena o projeto Tocadores, que
editou livros e filmes focados nos músicos da cultura popular, em diversas
regiões do país e também em Portugal. Fundou em 1999 a Olaria Projetos de Arte
e Educação, onde atua como diretora artística coordenando a realização de
diversos projetos.
Há mais de 15 anos se dedica a pesquisa
e divulgação das culturas tradicionais e populares, especialmente do Brasil e
de Portugal. Em seus livros e filmes, aborda o rico universo das comunidades
tradicionais e dos sons e sentidos das culturas locais. Atualmente divide seu
tempo entre a pesquisa musical, a realização de documentários e oficinas para
diversos públicos.
É autora de onze documentários e quatro
livros, entre outros produtos culturais, como exposições, seminários e cursos.
Mais informações em www.olariacultural.com.br
ou www.facebook.com/liamarchioficial.
Nenhum comentário:
Postar um comentário