por Ruy Castro
Tente uniformizar o design dos aviões
sem ouvir os comandantes, os controladores de voo, os engenheiros, o pessoal de
terra, os meteorologistas e as aeromoças. As turbinas acabarão no lugar das
rodas e as asas sairão do nariz do avião, como bigodes. Foi o que aconteceu à
língua portuguesa com o “Acordo” Ortográfico imposto pelo Brasil e, até hoje,
não aceito nem assimilado por Portugal.
Há dias, o ministro da Cultura, Juca
Ferreira, admitiu que “talvez tenhamos errado no processo de normatização, que
teve um caráter tecnicista e não envolveu os criadores de todos os países”.
Exatamente: esqueceram-se de combinar conosco, que lidamos com a língua nas
escolas, nos livros, nos jornais e na publicidade. Sem necessidade, baniram
grafias seculares de Portugal, assim como o hífen, o trema e os acentos
diferenciais. O resultado são monstrengos como “Dilma para para pensar” – com
perdão pelo oximoro.
De que adianta o “acordo” criar uma
escrita comum se as pronúncias continuam diferentes, além da particularidade de
milhares de conteúdos? No Brasil, uma mãe que se orgulha dos filhos e os
protege é uma mãe coruja. Em Portugal, é uma mãe galinha. Vá dizer aos
portugueses que eles deveriam mudar isso.
O ministro reconheceu que o português
dos países africanos “interage com 50 idiomas”. O do Brasil também, mas todos
em inglês. Por que Portugal não pode continuar a escrever “facto” se nós
próprios escrevemos “factual”?
A magia da língua portuguesa é a de
que, não importa a variedade de grafias ou pronúncias, ela é sempre
compreensível para os que a falam e leem, sejam portugueses, brasileiros ou
africanos. “A língua é viva, e temos a vida inteira para aperfeiçoar o Acordo
Ortográfico”, disse o ministro. Eu não tenho. Por isso, não aderi a ele.
Continuo escrevendo lingüiça e, se quiserem, me corrijam.
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